sábado, 30 de março de 2013

O casamento

Comecei a me arrumar lá pelas quatro da tarde. O casamento era só às oito mas tinha aquele ritual de salão de beleza: cabelos, pé e mão, sobrancelha, maquiagem... Depois ainda tinha que colocar o vestido, a meia-calça, a calcinha certa que não marca, tentar não acabar com o penteado e por fim calçar os saltos. Tudo corria bem, até umas seis horas, quando o telefone tocou e depois de alguns minutos veio minha mãe falando, "Cê não acredita, seu primo vai!".

Eu mal lembrava do meu primo. Até então tínhamos nos visto duas vezes na vida. Uma no meu aniversário de um ano, do qual não me lembro de nada fora o que foi filmado e outra vez quando estávamos com quatro anos e ele foi à minha casa. Ele mora na Califórnia, então não foi nada legal quando eu o vi aos quatro; não dava pra brincar com alguém que não entendia uma palavra do que eu dizia. Fim. Nosso contato acabou aí, depois dos meus quatro anos nunca mais tive notícias dele até uns seis meses antes do casamento quando acabamos nos achando na internet. Falávamos pouco. Eu achava ele bonitinho pelas fotos que via, mas nada demais.

Bom, eu sabia que ele estaria na cidade na época do casamento, mas não tinha certeza se ele iria. Então acabou sendo um choque quando minha mãe falou aquilo. Um choque bem maior do que gostaria. Desse momento em diante, todo o simples ritual da arrumação se complicou. Eu não sabia mais se o vestido era bonito o suficiente, comecei a detestar meu penteado, tremia... Um horror. Pior ainda pelo fato de que sou um desastre com salto alto, e no meio daquela crise nervosa ainda tinha que me preocupar em não cair.

Ok, consegui chegar na igreja intacta, tentando transparecer a maior calma do mundo. Afinal, ele era só um primo de longe. Qual o problema? Fiquei repassando esse pensamento na minha cabeça várias vezes e tentei me ocupar conversando com os convidados que iam chegando. E a hora passava, a igreja enchia, eu repetia meu mantra, mas nada dele chegar. Comecei morrer de raiva. Dele e, principalmente, de mim. Às vezes ele tinha até desistido de ir e eu estava ali, tremendo por nada. Ele deve ser um idiota, pensei. E comecei até a achar um pouco de graça da situação. Eu, tão segura de mim geralmente, inquieta por um primo de outro país que eu mal conheço? HAHAHAHA comecei a rir internamente e fui relaxando, ele com certeza tinha desistido de ir. Ótimo.

Ótimo, até eu virar a cabeça. Um carro tinha acabado de estacionar e lá vinha ele. Alto, com um terno preto, os cabelos bagunçados, de braço dado com a mãe e uma câmera fotográfica no pescoço. Se fosse um filme, essa cena certamente seria em slow motion... Ele vindo, bem na minha direção, com um sorriso tranquilo. Depois a câmera daria um close no meu rosto, nos meus olhos, tão minuciosamente maquiados começando a brilhar e eu ruborizando, como se de repente eu estivesse esquecido de vestir a roupa. Naqueles dois, três minutos, eu soube que estaria perdida. Eu queria fugir, queria gritar, queria nunca ter visto ele.

Aí ele chegou até mim, a mãe dele veio me abraçar e eu falei com ela, desejando que durasse muito aquele cumprimento já que eu não tinha a menor ideia do que falaria com ele. Mas logo acabou, ela virou e estávamos ali, eu e ele. Ele. Ele não desviava os olhos dos meus, e isso pra mim, era mais difícil do que falar, então quando abri a boca, ele disse:

- Your eyes... They're amazing.

Antes que eu pudesse responder qualquer coisa as mães vieram e nos puxaram para dentro. E então deu-se início a uma história de dois.




terça-feira, 26 de março de 2013

For my babies

Meu bem se foi
Não vai voltar
Em seu barquinho de papel
Onde é que ele estará?

Eu busco por constelações
Mas não há estrelas no céu
Por onde vou me guiar
Quando eu for te procurar?

O tempo corre lá fora
Aqui não passa jamais
Eu sinto quando você chora
Só que estou longe demais

Pequeno grande menino
Não tenha medo do escuro
Se seu barquinho afundar
Há sempre um tesouro escondido
No fundo de todo lugar

sem cor, sem dor, sem riso

eu vi nos olhos dela
um sorriso escondido
e tanta desesperança
com as roupas 'inda na mala
chegara como quisesse voltar

quinta-feira, 21 de março de 2013

Muita calma nessa hora...

- Mas o que houve?
- Você não entenderia...
- Não entenderia o que?
- Que não houve nada... Só que... De repente o mundo perdeu a graça.

Eu disse isso e quis sair correndo. Não era por não aguentar aquela pessoa sentada do outro lado da mesa na minha frente, era só porque estava cansado. Há semanas era só isso que me perguntavam, -Que que há? -Que foi?, cheguei no meu limite. Não que não gostasse da preocupação dos outros em relação ao meu estado de espírito, mas é que ninguém compreende quando eu tento explicar. Tá, tudo bem, acho que eu também não ajudo muito. Mas é que na verdade eu mesmo não sei bem o que tá acontecendo. Acho que tem a ver com o calor. Putz, faz um calor infernal há meses e isso me impede de pensar direito. As pessoas acham que é exagero, mas a verdade é que sinto minha cabeça derretendo, meus miolos fritando... É, é terrível. Acho que deve ter começado aí... Quando a temperatura passou dos 35 graus. Lembro bem quando foi isso, acho que começou naquele dia, que parecia ser um dia normal, até eu sair do meu quarto geladinho. Acordei e assim que saí para ir fazer meu xixi matinal, senti aquele mormaço, aquele inferninho. Fui ver e tava tudo alaranjado, da cor do sol. Credo! Eu tinha jurado à mim que ia no mercado. Queria entrar numa onda saudável e era um dia bom pra comprar frutas. ERA. FOI. Até eu sentir o chão quente e o ar parado, como se no céu tivessem ligado 30 aquecedores e direcionado o calor pra cá. Foi ver isso e desistir, na mesma hora voltei pra cama. Liguei o ar, botei um filme velho no DVD e fim, passei o resto do dia vegetando. Fui dormir com esperança de que o outro dia fosse melhor, aquela veeeelha esperança de que o próximo dia seja melhor que o que está passando. Só que não foi melhor, na realidade piorou. Lá pelo terceiro dia desisti de esperar que a temperatura abaixasse e resolvi, ao pé da cama, que iria curtir o calor, pegar uma praia, sei lá. Porém no outro dia meu desânimo era maior ainda. Tentei ir à praia mas sentia vontade de vomitar toda vez que via aquele pessoal super saudável, feliz virando de um lado pro outro embaixo do sol, como se o sol fosse a melhor coisa do universo. Passei a ter uma certa raiva de quem se divertia naquela temperatura. Daí pra frente parece que só piorou... Pessoas me lembravam sol, sol me lembrava pessoas, tudo me irritava e ninguém entendia como eu ficava cada vez mais recluso. No início eu me sentia meio só, mas com o passar do tempo fui me sentindo mais inteligente. Po, pra que gastar meu precioso tempo com gente? Todo mundo só quer saber de bunda e óculos espelhados... Quero mais é ficar namorando meu cobertor. O problema é que agora eu não sei mais o que fazer. Me apeguei profundamente à minha pessoa e minha casa. Não consigo sair. Meus filmes se tornaram meus melhores amigos e com eles não há discussão. Não sei se isso é mesmo um problema... Às vezes é fase, só fase. Né? Ah, tenho certeza que quando o sol se for eu volto. Né?

- Pronto, aqui tá a prescrição do remédio. É depressão.

quinta-feira, 7 de março de 2013

Just know I'm right here hoping
That you'll come in with the rain



Quando não há remédio pra falta a gente tenta dormir com a esperança...